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Sem cinto, com rastreador: taxistas mudam rotina após assaltos à categoria subirem 71%

Atualizado: 10 de set. de 2023



Nos 30 dias de junho, 72 taxistas foram atacados em Salvador. O número representa o dobro das ocorrências registradas no mesmo período de 2021 e sinaliza para uma média de 2,4 taxistas vítimas de assalto por dia naquele mês. Mas, o que tem preocupado a categoria é que o número de profissionais assaltados no primeiro semestre desse ano é 71,6% maior do que no mesmo período do ano passado. Entre janeiro e junho ocorreram 374 assaltos a condutores de táxi, contra 218 no mesmo período de 2021. Os dados são da Associação Geral de Taxistas (AGT). Diante da violência, motoristas criam formas de proteção como evitar cinto de segurança, não transportar casais e usar rastreadores de percurso nos veículos.

Além do crescimento na quantidade de assaltos, a associação registrou também um aumento de 69% na quantidade de carros levados durante os assaltos. É que, enquanto 39 veículos foram levados pelos bandidos nos assaltos registrados no primeiro semestre de 2021, o número subiu para 66 no mesmo período de 2022.

Numa tarde de outubro do ano passado, Almiro Fonseca, 70 anos, tinha quebrado a promessa pessoal de nunca aceitar casais desconhecidos apanhados na rua como clientes. A viagem seguiu tranquila até que, na altura de Stella Maris, os dois passageiros anunciaram o assalto. Em desespero, o taxista abriu a porta do carro, quando a velocidade estava reduzida, e se jogou no mato.

“Ele costuma andar devagar e já está sem o costume de usar cinto. Eu não consigo recriminar de modo algum. Se tornou algo como policiais, que claro que não vão usar cinto de segurança”, conta Almiro Junior, que, escondido do pai, pôs o rastreador no veículo dele. Estava preocupado com as notícias de assaltos aos taxistas.

Passados 15 minutos do roubo, o veículo já tinha sido rastreado. Avisado pelo pai do crime, Junior abriu o celular e acompanhou a movimentação do veículo ao redor da cidade por meio de um aplicativo conectado ao rastreador. Só por isso conseguiram recuperar o carro rapidamente. O custo do rastreamento é de R$ 50 mensais.

“Agora fico acompanhando, se vejo ele rodando em tal velocidade, já acho estranho. Se está num lugar ‘boca quente’ [perigoso], fico de olho”, conta Junior.

Numa empresa de rastreamento de veículos, em Salvador, a procura pelo serviço subiu 40% desde o ano passado. O custo anual do dispositivo é de, em média, 600 reais, a depender da empresa e do pacote contratado.


“Na pandemia, o pessoal ficou com mais medo da violência e acabou procurando o serviço. Mas até tenho sentido que, agora, abaixaram a guarda mais um pouquinho”, conta Jefferson Souza, proprietário de uma companhia que atua na capital.

A maioria dos carros rastreados pela empresa, no entanto, ainda são os utilizados por motoristas de aplicativo. A procura de taxistas é mais recente, segundo empreendedores do ramo de seguros e rastreamento de veículos. Hoje, calcula a AGT, 30% dos taxistas estão com rastreadores instalados nos carros.


Em 20 dias, dois assaltos

Dos 73 taxistas assaltados em maio deste ano, 53 – ou seja, 72% deles – tiveram o carro levado pelos ladrões. Em menos de 20 dias, foi o que aconteceu, duas vezes, com Joelson Ferreira, 51 anos, 28 dos quais dedicados à vida atrás do volante.

Na primeira vez, em janeiro, três pessoas pediram uma corrida, no Comércio, em direção à Ribeira. Os criminosos mantiveram Joelson como refém entre 20h30 e 1h da manhã. No mês seguinte, em fevereiro, o taxista foi novamente vítima da violência. Dessa vez em uma corrida com destino a Periperi.

O assalto acompanhado de sequestro e agressões é uma modalidade que tem preocupado ainda mais taxistas, como Joelson. Em abril, o próprio presidente da AGT, Denis Paim, sofreu um ataque relâmpago, na altura da Avenida Bonocô. Depois dos dois atentados que sofreu, Joelson decidiu tornar o carro rastreável.

“Três dias depois [do segundo assalto] eu decidi colocar o rastreador e o bloqueador. Está muito perigoso, eles são muito perversos, não só roubam, como batem, humilham”, conta Joelson.

Pelos dois serviços no carro, ele desembolsa R$ 135 mensais. O bloqueador divide opiniões entre taxistas. Uns, acham uma ferramenta eficiente. Outros, temem o risco de acidentes. Isso porque o bloqueador opera da seguinte forma: bloqueia a ignição ou a bomba de combustível quando acionado. Ligado incorretamente, como em um momento em que o carro esteja em movimento, pode provocar acidentes.


A saga da recuperação

Os assaltos contra taxistas estão, geralmente, dispersos em trechos de avenidas de Salvador como a Luís Viana Filho (Paralela), Mário Leal Ferreira (Bonocô) e a Afrânio Peixoto (Suburbana), calcula a AGT. Mas o maior receio de taxistas é o ponto de partida ou o destino das corridas.

Os bairros mais temidos para bater ponto são: Mussurunga, Valéria, Castelo Branco, Vila Canária, Paripe, Federação, Barra, Fazenda Grande do Retiro e Cajazeiras. Com a redução do número de corridas, é mais comum que taxistas prefiram escolher pontos para esperar corridas ou recebam clientes por aplicativo.

Quando um táxi é assaltado, começa uma saga pela recuperação do veículo. Principalmente quando o carro não possui rastreador ou os criminosos foram mais rápidos e tiraram as faixas azul e vermelha do táxi para evitar a identificação.

“Começo a colocar em grupos de whatsapp para localizar os carros. Pelo zap, vamos nos comunicando. Quando o taxista faz o Boletim de Ocorrência ou tem o rastreador, fica mais fácil”, explica Denis Paim, presidente da AGT.

Em abril, a associação participou de uma reunião com a Polícia Militar (PM) para discutir ações voltadas para os taxistas. A reportagem tentou contato com a PM, mas não teve retorno até o fechamento da publicação.

A violência, acrescida do cenário de precarização do trabalho de taxista, também afasta profissionais das ruas. Em dezembro do ano passado, Sidney Bahia, 42, tirou o carro de circulação e, hoje, investe no ramo de limpeza de estofados. Embora nunca tenha sido assaltado, os relatos de amigos – entre eles um que foi esfaqueado – assustavam.

“Trabalhava muito à noite. Saía de manhã, voltava à tarde, e 21h eu estava na rua de novo e ficava com muito medo. A gente vê muita coisa também estando nas ruas”, conta Bahia.

Formado em administração, ele pretende, ainda assim, poder voltar a circular, mas não como atividade principal, como uma “válvula de escape”. O alvará permanece ativo.

“Meu amor pela profissão não acabou e eu vou sim voltar a ter um táxi”, conta o ex-taxista que, no retorno, tentará concentrar a rotina de trabalho em regiões que considera mais seguras, como os bairros da vizinhança onde mora.


Escrito por: Correio Da Bahia

Publicado em: 22 de julho de 2022


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